Cultura alimentar e educação popular: partilhas de mulheres ciganas na EJA
Keywords:
Educação Popular, Mulheres Ciganas, Práticas Alimentares, Saberes TradicionaisAbstract
O presente trabalho, resulta de pesquisa em andamento e investiga a partilha de saberes relacionados às práticas alimentares entre mulheres ciganas da comunidade de Caldas Novas (GO), a partir de uma abordagem fundamentada na Educação Popular. Desenvolvida no âmbito da Educação de Jovens e Adultos (EJA), pretende-se analisar como os saberes alimentares são compartilhados entre mulheres ciganas, destacando suas contribuições para uma educação comprometida com a diversidade e a equidade. A metodologia adotada é qualitativa e utilizou como principais instrumentos as escritas narrativas produzidas em cadernos individuais durante atividades pedagógicas com temas geradores como “memórias da comida”, “ser mulher cigana”, “cotidiano da minha família” e “pratos tradicionais”. A análise, em andamento, está sendo conduzida com base na Análise Textual Discursiva (ATD), articulando os textos produzidos com os referenciais teóricos de Paulo Freire, Brandão, Bosi e Poulain. Participaram 27 mulheres ciganas, com idades entre 20 e 74 anos, pertencentes a diferentes núcleos familiares da comunidade. Para preservar suas identidades, os nomes foram substituídos por codinomes inspirados em flores, como Rosa, Cravo e Lírio, remetendo à força, à beleza e à diversidade feminina presentes nas narrativas. As participantes se autodeclararam como pardas (14), negras (9) e brancas (4), evidenciando a pluralidade étnico-racial da comunidade e desafiando estereótipos homogeneizantes comumente atribuídos aos povos ciganos. Essa diversidade também se manifesta nos relatos de vida, nas práticas alimentares e nos modos de viver e resistir coletivamente. Os resultados preliminares indicam que as práticas alimentares estão imersas em uma complexa rede de significados afetivos, espirituais e identitários. Alimentos como o chai, o arroz com pequi, o pão cigano e as sopas de ervas são recorrentes nas narrativas e revelam tanto saberes ancestrais quanto estratégias cotidianas de solidariedade. Os relatos vinculam o preparo dos alimentos à memória familiar, à fé – com destaque para Santa Sara – e a rituais religiosos, além de associarem essas práticas à resistência frente à pobreza, ao racismo e à exclusão social. As mulheres se mostram como educadoras, cuidadoras e detentoras de um saber que resiste à invisibilização escolar. Conclui-se que a valorização desses saberes na escola contribui para a efetivação das políticas de Educação das Relações Étnico-Raciais (ERER), promovendo práticas pedagógicas que reconhecem e afirmam a diversidade como eixo estruturante da escola. Reconhecer a cozinha enquanto espaço educativo e cultural é também reconhecer a mulher cigana como sujeito político de saberes, desafiando os limites impostos pela invisibilidade histórica e pelo preconceito.